Um agricultor gravou os animais mortos no igarapé Santa Rosa. Prefeitura nega, mas Ipaam constatou crime ambiental
Robson Adriano
Moradores da comunidade São João Batista, acusam a prefeitura de Iranduba (a 27 km de Manaus) de provocar matança de centenas de peixes com uma obra viária na localidade. A equipe do ACRITICA.COM esteve na comunidade e observou que a argila e o barro usados pela prefeitura estão impedindo a saída dos animais do igarapé para o rio que banha a São João Batista, o rio Solimões.
Com o avanço da seca, o pouco de água que ficou no igarapé represado no local oferece cada vez menos oxigênio para os peixes. O agricultor José Jânio, 56 anos, gravou com o celular o igarapé tomado pelos animais mortos, o que levou a equipe à comunidade, no ramal do Jandira, zona rural de Iranduba.
O agricultor afirmou que há uma semana a Prefeitura de Iranduba realizou obras de infraestrutura no lugar, jogando mais argila para nivelar a pista e com a força dos banzeiros o barro cedeu ocasionado a obstrução do fluxo de água.
gricultor José Jânio disse que há uma semana a Prefeitura de Iranduba realizou obras no local, o que causou o transtorno e a morte dos peixes (Márcio Silva)
“Jogaram aterro porque estava mais baixo (a pista). O peixe sente que tá secando e vem para o rio, ainda tentaram por três dias, mas não conseguiram sair e morreram”, detalhou Jânio.
A reportagem acompanhou um trecho do igarapé Santa Rosa e flagrou alguns peixes mortos ainda na beira do lago. Nas imagens do repórter fotográfico Márcio Silva, de A CRÍTICA, é possível ver peixes de distintas espécies mortos nas margens do córrego.
Por falta de oxigênio e alta temperatura da água, centenas de peixes morreram. (Márcio Silva)
O agricultor Jânio informou que ao se deparar com a cena dos peixes tentando respirar e para evitar o desperdício, avisou os comunitários que pescaram os animais e os levaram para consumo em casa.
Jânio explica ainda que o aterro feito pela Prefeitura de Iranduba costuma ceder com o movimento de subida e descida do rio, todos os anos. O problema causado pelas condições precárias da obra também afeta o transporte da produção agrícola dos comunitários que precisam alugar meios de transporte para a escoação dos produtos. “Não caiu esse ano porque os comerciantes e nós nos reunimos e construímos um rip-rap para não ceder. Já aconteceu de não alagar tudo e essa estrutura cair por causa do aterro mal feito. E fica todo mundo prejudicado e isolado. A saída é pegar a produção (agrícola), alugar uma canoa e levar para um caminhão. Além de aumentar o custo, também sobe a mão de obra do agricultor e já ganhamos pouco. A logística vai lá para cima”, frisou.
Barragem foi construída sem a vazão para a passagem da água do igarapé para o rio Solimões, represando os peixes e os deixando sem oxigênio. (Márcio Silva)
Promessa
O líder comunitário e agricultor, Selino Araújo, 62 anos, espera que a promessa feita pelo executivo municipal de Iranduba seja cumprida. “Eles nos prometeram que assim que secar, vão abrir o bueiro que hoje está tampado. Já me falaram que vão cavar e colocar o bueiro. Se acontecer, acabou o problema. Essa nossa estrada está com 30 anos de construída e os governantes vem aqui e dizem que não vão fazer porque está próximo do barranco”, pontuou.
Crime ambiental, afirma Ipaam
Por meio de nota, o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) esclareceu que após uma ação fiscalizatória no ramal do Jandira, o delito foi constatado. “A obra irregular para restauração de uma via de acesso no Jandira, foi feita sem a autorização prévia expedida pelo Ipaam, ocasionando a obstrução do fluxo natural do corpo hídrico (igarapé Santa Rosa), o que ocasionou a morte de peixes na área alagada formada pelo barramento do fluxo natural”, informou.
Agricultores e comunitários da comunidade São João Batista reclamam da falta de instalação de um bueiro para dar vazão à agua do igarapé
O Instituto informou ainda que após a constatação a Prefeitura de Iranduba, foi notificada para que tome providências imediatas quanto à desobstrução da tubulação que interliga o igarapé Santa Rosa ao rio Solimões, que seja apresentado um relatório fotográfico com o antes e depois, para monitoramento.”Outras informações sobre a obra também foram solicitadas, visto que a atividade está classificada como potencial poluidor degradador e um auto de infração foram emitidos”, finalizou o órgão.
‘Fenômeno natural’, afirma secretário
O secretário municipal de Meio Ambiente, Desenvolvimento e Sustentabilidade de Iranduba, Lúcio da Costa, afirma que a morte dos peixes ocorreu em razão do forte calor somada a seca na região. “Existe certa vazão, mas ficou uma grande poça e com as altas temperaturas os peixes ficaram sem oxigênio e começaram a morrer. Não foi um problema causado por obstrução do igarapé. É um fenômeno natural que acontece todos os anos no Amazonas”, declarou.
Secretário nega obstrução
Já o secretario municipal de Infraestrutura e Planejamento Urbano, Yago Brandão, afirma que não houve obstrução do bueiro. “O acesso da água do rio que fica do outro lado continua passando pelo bueiro e o serviço feito recentemente foi para permitir o acesso da comunidade para o outro lado (da via)”, disse. A pasta não informou previsão de obras sobre a pavimentação para o ramal do Jandira.